A exploração da América Latina vista por um Sul-Americano  Te han sitiado, corazón, y esperan tu renuncia,
los únicos vencidos, corazón, son los que no luchan.
(...)
No te entregues corazón libre, no te entregues...
No te entregues corazón libre, no te entregues...
A passagem acima pertence à música Corazón Libre, interpretada pela veterana Mercedes Sosa. Estas poucas linhas ilustram a postura de pensadores e artistas sul-americanos das décadas de 60 e 70, período de grandes turbulências políticas e ideológicas em todo o mundo.
Durante essas décadas, ditaduras militares foram forjadas na América do Sul. A época de grandes lutas foi caracterizada, dentre outras coisas, pela perseguição a qualquer indivíduo contrário a esses regimes. O livro As Veias Abertas da América Latina, do escritor e jornalista uruguaio Eduardo Galeano, foi publicado em 1971 - dois anos antes de se instalar a ditadura no Uruguai e de começarem as perseguições ao escritor, por envolvimento com correntes marxistas.
Eduardo Galeano é uma das personalidades mais destacadas da literatura ibero-americana. Seus trabalhos são conhecidos por não terem um gênero fixo, variando entre ficção, poesia, jornalismo, análise política e história. Em entrevista concedida em 1988 para Ataulfo Tobar, o escritor afirma: "Soy un escritor que quisiera contribuir al rescate de la memoria secuestrada de toda América, pero sobre todo de America Latina, tierra despreciada y entrañable"
As Veias Abertas da América Latina contém crônicas e narrações que tentam reconstruir as mazelas da América do Sul partindo da exploração dos seus recursos naturais ao longo da sua história. Faz-se uma abordagem de como a questão se dá no período das nações colonialistas (século XV ao século XIX) e na época das nações imperialistas(século XX).
O livro inicia com um sugestivo dito proferido em 1808 pela Junta Insurrecional de La Paz: “Temos guardado um silêncio bastante parecido com a estupidez”. No intuito de ‘abrir a boca’ a obra é dividida em duas partes: A Pobreza do Homem como Resultado da Riqueza da Terra e o Desenvolvimento é uma Viagem Com Mais Naufrágios do que Navegantes.
Nesses dois grandes capítulos são abordadas a febre do ouro e da prata e as atrocidades cometidas em seu nome, os engenhos de açúcar no Brasil, a estrutura contemporânea da espoliação da América Latina, dentre outras questões. Há ainda uma introdução que contextualiza o leitor chamada Cento e Vinte Milhões de Crianças no Centro da Tormenta.
Alguns dizem que o modo como os dados são apresentados fazem de As Veias Abertas da América Latina uma obra exagerada, talvez por Eduardo Galeano ter participado de correntes marxistas na época da sua publicação. Outros dizem que este livro marcou a época em que foi escrito. Independente das duas posições, uma coisa é certa: o livro oferece um ponto de vista distinto da história oficial aprendida na escola.
A Guerra do Paraguai, por exemplo, tão exaltada em manuais de história de outrora é apresentada com o título a guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai aniquilou a única experiência com êxito de desenvolvimento independente. Nesse capítulo o autor tenta mostrar que o Paraguai, no fundo, foi vítima de interesses externos. Não dos países vencedores do conflito, mas de outros que – utilizando os países da tríplice aliança como marionetes – impuseram seus interesses na América do Sul. Essa é uma das primeiras formas do imperialismo que, segundo o autor, ainda existe.
Em síntese, As Veias Abertas da América Latina é uma obra de fôlego que permite confirmar (ou rechaçar) as previsões de toda aquela geração que deu seu sangue durante as décadas de repressão. Ela permite conhecer ainda valores dessa época, que até hoje se manifestam em livros, em discursos, na política, e em letras de músicas nostálgicas:
Adelante, corazón, sin miedo a la derrota,
durar no es estar vivo, corazón, vivir es otra cosa.
No te entregues corazón libre, no te entregues...
Comentários da contracapa da 6ª edição, de 1979
Jorge Robespierre Tomás Japur – jorgejapur@yahoo.com.br
5º semestre/jornalismo
24/6/2008
Edições Anteriores
Percursos e Percalços da Fama
Fulgor e Morte de Joaquin Murieta
Monstros: a dor e a alegria de um são a dor e a alegria de todos
O fenômeno In Rainbows, do Radiohead, na Internet
"Nascidos em Bordéis" : emocionante e surpreendente
Conheça a obra "Surplus"
"Diretas Já!" : O humor na luta pela Democracia
Saiba mais sobre o filme "A Queda! - As Últimas Horas de Hitler"
|