2.1.1 Os ‘Bad-Boys’Um tema amplamente divulgado foi à convocação dos Bad-Boys. O termo refere-se à imagem existente em relação a Edmundo e Romário e tem a função de caracterizá-los.
A respeito desses jogadores ficou registrada, tanto na cabeça do torcedor quanto nos relatos de seus atos na mídia, uma série de episódios polêmicos envolvendo suas vidas. Devido a isso, foram vinculadas a eles duas imagens bem marcantes:
1ª) Uma negativa, de mau comportamento; pois a dupla tem a fama de ‘brigões’, ‘indisciplinados’, ‘pessoas de pavio curto’, ‘criadores de caso’, irresponsáveis e festeiros. Vários episódios envolvendo suas relações com os adversários, treinadores, dirigentes, torcedores e com os próprios jornalistas, contribuíram decisivamente para a construção dessa imagem. Adiciona-se a esses fatos o enfoque, muitas vezes polêmico, com que foram transcritos e divulgados na mídia.
2ª) Uma imagem positiva, de excelentes jogadores.
Essa imagem dos jogadores se apoia, sobretudo, no desempenho apresentado por ambos nas suas respectivas equipes.
No jornal Folha de São Paulo, antes da Copa Ouro, ligado à denominação “Bad-Boys” noticiou-se e veiculou-se o seguinte:
No antetítulo da matéria: “Técnico da seleção chama Romário para formar dupla com Edmundo.”
Logo em seguida o título indicava: “Zagallo convoca ataque de ‘bad boys’ para a Copa Ouro”
O texto relativo ao título iniciou referendando que: “(...) A seleção Brasileira vai contar com uma dupla de ataque formada por ‘bad boys’(meninos maus)”. Caracterizando, ainda, que “(...) os dois atacantes, conhecidos pelo comportamento polêmico, serão as principais atrações da seleção no torneio.”³
O título permite constatar a existência de um sentido ambíguo. O termo “Bad-Boys”, como anteriormente já caracterizado, pode estar relacionado com a imagem de mau comportamento da dupla de jogadores. Realça-se assim, o sentido negativo. Pode-se também relacionar o termo "menino mau" a uma qualidade positiva para o futebol. Isso ocorre pela noção, ou a unanimidade (mentalidade) bastante difundida no meio futebolístico de que jogar futebol é tarefa mais para durões do que para bons meninos. As características de “Bad-Boys” passam então a ser consideradas qualidades ou méritos a serem buscados. Sendo assim, explica-se a proliferação de outros termos como “animal”, que não deixam de ter sucesso de aceitação e divulgação na mídia. Portanto, ter um “animal” no time ou um “menino mau”, “malandro de morro”, ou “malandro de rua”, já seria, considerando a idéia vigente sobre esses conceitos, uma garantia de sucesso esportivo. É, por exemplo, bastante divulgada e conhecida à qualidade principal de um bom zagueiro: “Bom zagueiro, conforme a visão dos futebolistas e alguns jornalistas esportivos, é aquele que impõe respeito ao adversário! Desnecessário é explicar o que é entendido no meio por “impor respeito ao adversário”. Pode-se encontrar jargões desse tipo no acompanhamento de jornais e transmissões esportivas. Sem dúvida nenhuma, essa associação é amplamente aceita na mídia, mais especialmente na cabeça dos torcedores, e acompanha a cultura futebolística. Em síntese, baseado no anteriormente exposto, existem elementos suficientes que sustentariam a relação do termo "Bad-Boys" ao sentido positivo.
O título sugere ou permite as seguintes conclusões:
- Uma crítica ao técnico (uma interpretação negativa), pois Zagallo convoca pessoas que devido ao seu comportamento não poderiam fazer parte do elenco. O próprio uso da linguagem estabelece que mau é o antônimo de bom, portanto, não pode ser aceito. Via de regra, isso é senso comum. Seriam atração*, como mencionado, em conseqüência de seu comportamento polêmico.
- Zagallo agiu corretamente (uma interpretação positiva) ao convocar “os maus meninos”, pois esses são considerados importantes para assegurar bons resultados em uma competição. Eles seriam a atração pelo seu futebol.
A Folha de São Paulo, usando de uma disposição comum e regularmente utilizada pelos meios de comunicação, onde o meio revê o próprio meio, e seguindo outros enfrentamentos passados4 , referenda mais uma vez os “Bad-Boys”, voltando ao tema em outra publicação, utilizando a dupla malvada, ou de maus meninos, agregando-a via título da seguinte maneira: “Bad – dupla e burocráticos na Copa Ouro” 5
O título dá margem para as seguintes interpretações:
- Que a seleção estará mal representada na Copa Ouro, pois seu elenco será composto de burocráticos e meninos maus.
- Que os maus meninos serão o único ponto positivo numa seleção de burocráticos 6 .
No texto das matérias, em relação ao tema “Bad-Boys”, não fica bem caracterizada a conotação jornalística pretendida ao termo, se positiva ou negativa. Porém fica claro, como já descrito, a conotação ambígua dos títulos e, portanto, não se pode dizer que essa não é intencional. Supõe-se que a intencionalidade, ou uma das intencionalidades existentes é justamente a criação da ambigüidade. A leitura e análise do conteúdo teórico de livros referentes à elaboração de títulos no jornalismo permite pontuar sua função e intenção. Os títulos são muito bem selecionados, deles é possível extrair uma construção, ou indicações que sugerem uma intencionalidade 7 .
Conclui-se, então, que se os títulos e as notícias anteriores foram construídas de forma a transmitir um significado ambíguo, é por que se esperava transmitir aos leitores, ou parte desses, pelo menos uma das duas conotações possíveis. Não se pode afirmar, conseqüentemente, que a intenção jornalística era de evitar mal-entendidos quanto à compreensão de seu artigo. Justamente o significado do título encontra-se e é mais rico pelo conteúdo e ilustrações que sugere nas entrelinhas, do que pela precisão do que afirma. Também nesse caso, pode-se especular em relação à “parcialidade” do comentário ou da notícia em relação à existência da “neutralidade”. Não se defende aqui ou se exige do jornalismo a possível existência de uma neutralidade total. É desejo apenas a caracterização de que a ambigüidade pode prestar-se para a tomada de posição em relação a uma ou outra das possibilidades sugeridas por ela. Ou ela pode contribuir ou conduzir para uma outra posição que se caracterizaria pela confusão na compreensão. Se o objetivo almejado é confundir a compreensão, a pergunta que se faz é: Quais os interesses que promoveriam essa atitude? Identificar quais seriam estes interesses é uma questão muito difícil de responder.
3 Ver Folha de São Paulo, caderno 3 – p.11, de 22/01/98. Matéria feita por Sérgio Rangel da sucursal do Rio.
* Fica a pergunta: a que tipo de atração refere-se o jornal: À atração futebolística ou à conseqüência de seus comportamentos polêmicos?
4Situação em que Zagallo e a mídia disputam paralelamente um “quem pode mais”. Zagallo de seu lado, afirmava que nunca tinha perdido, portanto um eterno vencedor. A mídia por sua vez, destacava algumas derrotas do “vencedor”. Exemplo disso, a recente atuação do selecionado nacional frente aos nigerianos e japoneses na Olimpíada, e outras mais.
5Ver Folha de São Paulo, caderno 4, p. 2, em 01/02/98. Por Alberto Helena Jr., da equipe de articulistas.
6 Não existe a possibilidade de ‘burocráticos’ ter uma conotação positiva, pois, como será demonstrado no próximo item, é dado ao termo, no mesmo jornal, uma conotação negativa.
7 Sobre esta conduta; Fausto Neto faz menção das necessidades que os enunciadores midiáticos têm de indicar os caminhos que os acontecimentos deverão percorrer, bem como organizar uma estruturação que permita determinar causas e conseqüências de possíveis ocorrências. Ver mais sobre o assunto em “O IMPEACHMENT DA TELEVISÃO”, no capítulo: O PODER DE PREVER O PODER DE SENTENCIAR, p.49.
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